Qui, 30 de setembro de 2021, 11:29

Entenda por que oxigênio analisado em árvores da Caatinga é indicador de secas
Pesquisa avaliou correlação entre variação isotópica do oxigênio 18 e parâmetros climáticos
Oxigênio de anel de crescimento é indicador de mudanças hidroclimáticas. Fotos: Adilson Andrade/Ascom UFS
Oxigênio de anel de crescimento é indicador de mudanças hidroclimáticas. Fotos: Adilson Andrade/Ascom UFS

As árvores também registram a própria história. A seu modo, claro. E esse álbum de memória está guardado no tronco, nos chamados anéis de crescimento. Observados no plano transversal da madeira, eles são vistos como linhas que lembram movimentos concêntricos. Cada camada, como na imagem acima, acumula informações sobre a influência das condições ambientais e climáticas no crescimento anual das plantas.

Sensíveis a fatores externos, como chuva e umidade, os anéis de crescimento apresentam variações no tamanho e na constituição isotópica incorporada à madeira. A partir deles, é possível determinar, por exemplo, a idade das árvores.

A primeira fase de uma pesquisa da Universidade Federal de Sergipe (UFS), em parceria com a universidade alemã Friedrich-Alexander Erlangen-Nürnberg (FAU) , investigou a correlação entre a variação isotópica do oxigênio 18 e os parâmetros climáticos, como a precipitação, umidade relativa e temperatura do ar, a partir da análise de anéis da Cedrela odorata L., conhecida como Cedro.

Publicado na revista Springer Trees, o estudo mostrou que a variação isotópica do oxigênio 18 interanual está relacionada às condições climáticas e concluiu que a medida pode ser um indicador de mudanças hidroclimáticas em florestas tropicais sazonalmente secas, como a Caatinga.

O artigo foi assinado pelos pesquisadores Claudio Lisi, Mariana Pagotto, Clayane Costa e Ítallo Romany, do Laboratório de Anatomia Vegetal e Dendroecologia (LAVD-UFS), e Achim Bräuning, do Instituto de Geografia da FAU.

Os pesquisadores usaram amostras coletadas com trado de incremento, um instrumento não destrutivo de perfuração. Para a análise, foi extraída a celulose de 50 anéis de cinco árvores de Cedro do semiárido sergipano, o que abrangeu um período de 50 anos (1968-2017).

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Mariana Pagotto é autora da pesquisa publicada na Springer Trees
Mariana Pagotto é autora da pesquisa publicada na Springer Trees

Segundo Mariana Pagotto, o estudo mostrou que a seca vem aumentando na região da Caatinga desde os anos 1990, em especial, a partir da década de 2000. “As condições de seca no Nordeste, especialmente na Caatinga, aumentaram muito em comparação às décadas anteriores e isso foi registrado na razão isotópica do oxigênio que está presente na celulose das árvores”, afirmou.

Mariana ainda explicou que a análise de isótopo é uma técnica precisa para identificar a relação entre as árvores e o clima. “Conseguimos mostrar que a variação dos isótopos de oxigênio que ocorre nos anéis de crescimento são influenciadas não só pelas chuvas, mas também por toda uma condição de umidade que é típica da Caatinga”, disse.

"Então, a temperatura do ar, a umidade relativa do ar e também o déficit hídrico do solo influenciam nessa razão isotópica do oxigênio nos anéis de crescimento”, complementou.

O coordenador do LAVD e professor de Biologia, Claudio Lisi, observou que os estudos apontam a acentuação do déficit hídrico no período de seca prolongada, a exemplo, citou o que se iniciou em 2012. “Isso faz com que as plantas sofram mais e retrata a população humana que necessita desse recurso também para a sua sobrevivência.”

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Professor Claudio Lisi desenvolve pesquisas sobre anatomia vegetal e dendroecologia
Professor Claudio Lisi desenvolve pesquisas sobre anatomia vegetal e dendroecologia

O professor ainda destacou a importância das informações registradas pelas plantas do bioma.“Isso permite entender efeitos regionais e globais, por exemplo, efeito do El Niño ou de deslocamento de massas de ar com umidade que chegam até a região do Nordeste e fazem com que as populações de planta cresçam bem ou possam sofrer com a falta desse recurso”, complementa.

“Entender o que a planta nos diz.” Essa frase do coordenador pode resumir a missão do Laboratório de Anatomia Vegetal e Dendroecologia da UFS. Criado em 2009, o LAVD vem estudando, a partir do passado das espécies, os efeitos ambientais no crescimento das plantas.

Claudio Lisi acrescentou que têm sido estudadas as consequências da aridez para o crescimento das plantas no semiárido sergipano, ou seja, os possíveis impactos da falta de chuva. “Com isso, a gente retrocede ao passado e voltamos a entender melhor como essa influência do ambiente age sobre o desenvolvimento dessas árvores”, disse.

Os fragmentos extraídos das árvores para as pesquisas são guardados na Xiloteca ASEw, um espaço que reúne a coleção científica do laboratório, como detalha o técnico Ítallo Romany. “Todo o material coletado no campo, seja na Caatinga ou na Mata Atlântica, vem fazer parte do acervo da xiloteca e pode ser utilizado para as pesquisas que são desenvolvidas no laboratório e formação dos profissionais da área da Biologia, Agronomia, Engenharia Florestal e demais áreas”.

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Ítallo Romany, técnico em laboratório da UFS, atua na Xiloteca ASEw do LAVD
Ítallo Romany, técnico em laboratório da UFS, atua na Xiloteca ASEw do LAVD

O LAVD está localizado no primeiro andar do Complexo Laboratorial de Biologia e Engenharia Florestal, no campus de São Cristóvão. As visitas à xiloteca estão, temporariamente, suspensas em virtude da pandemia da covid-19, informou Romany. Quando a visitação estiver liberada, os pedidos devem ser encaminhados para os e-mails: tecnicolabio@gmail.com ou cslisi@ufs.br.

Abel Serafim - Rádio UFS

comunica@academico.ufs.br

Atualizado em: Ter, 05 de outubro de 2021, 17:29