Qui, 23 de setembro de 2021, 08:59

Estudo aponta 50 municípios brasileiros com risco elevado de covid-19 na população obstétrica
Artigo publicado na The Lancet associa incidência e mortalidade a fatores socioeconômicos

Cinquenta dos 5.570 municípios brasileiros apresentam alto risco de contaminação por covid-19 para gestantes e puérperas. É o que revela um estudo liderado por pesquisadores da Universidade Federal de Sergipe (UFS) ao mapearem os casos e óbitos provocados pela doença na população obstétrica no Brasil durante 16 meses. O artigo com os resultados da pesquisa foi publicado no último dia 10, na revista The Lancet, uma das mais prestigiadas do mundo na área médica.

Entre março de 2020 e junho de 2021, de acordo com dados do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe do Ministério da Saúde (SIVEP), o país registrou 13.858 casos e 1.396 mortes por covid-19 entre mulheres grávidas e em pós-parto.

Nesse cenário, a análise de base populacional indica as localidades com risco elevado de infecção ao traçar a relação entre os indicadores da doença e questões de vulnerabilidade socioeconômica e de iniquidades em saúde.

O epidemiologista e professor do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da UFS, Victor Santana Santos, liderou o trabalho em parceria com sete pesquisadores de mais duas instituições de pesquisa, sendo uma delas do Reino Unido.

Ele sintetiza que o estudo “fornece evidências científicas dos efeitos das desigualdades geográficas e regionais, disparidades de saúde e pobreza sobre a população obstétrica afetada pela covid-19 em um país de baixa e média renda.”


Professor Victor Santana Santos liderou pesquisa de abrangência nacional sobre a covid-19. Foto: Adilson Andrade/Ascom UFS
Professor Victor Santana Santos liderou pesquisa de abrangência nacional sobre a covid-19. Foto: Adilson Andrade/Ascom UFS

Os pesquisadores mapearam os casos e óbitos da doença no território nacional e realizaram uma análise de distribuição espacial com o uso de técnicas de estatística. “Isso permite identificar se aquele município ou aquela redondeza vai se constituir em um aglomerado, se existe um maior risco da mulher puérpera ou gestante adquirir a doença ali,” explica o epidemiologista.

As variáveis consideradas para a correlação vão de índices de analfabetismo à disponibilidade de leitos de UTI. Entre as quais: índice de vulnerabilidade social, trabalho e renda, índice de desenvolvimento humano municipal (MHDI), população que vive em casas com serviços inadequados de abastecimento de água e esgoto e em casas com serviços inadequados de coleta de lixo, pessoas analfabetas, porcentagem de pessoas com baixa renda, desemprego, leitos hospitalares, cobertura da estratégia de saúde da família e coberturas dos médicos e enfermeiros.

Victor Santana destaca que os casos e mortes maternas por covid-19 foram distribuídos de forma heterogênea pelas regiões brasileiras e se concentraram em municípios do interior do país, mostrando a relação do avanço da contaminação com as condições de vida da população.

“Observamos que aqueles municípios com menos recursos de infraestrutura em saúde e maiores desigualdades socioeconômicas tiveram as maiores taxas de incidência e mortalidade materna pela covid-19. São aqueles municípios com deficiências na sua estrutura e cobertura de saúde,” ressalta.

Incidência em gestantes e puérperas

A análise de distribuição espacial apontou uma variação no número de casos por localidade. Nisso, 3.435 municípios brasileiros apresentaram taxas de incidência abaixo de 211 casos por 100 mil nascidos vivos; 105 tiveram entre 2.210 e 3.884 casos; e 45 entre 3.884 e 7.418 casos. Outras 1.985 cidades não registraram casos entre gestantes e puérperas no período analisado.


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Entre os 50 municípios identificados com alto risco nessa população, a Paraíba (13) tem o maior número de cidades nessa condição. Em seguida, estão os estados do Ceará (7), Amazonas (7), São Paulo (7), Rio Grande do Sul (6), Minas Gerais (4), Paraná (3), Mato Grosso (2) e Santa Catarina (1).

“Aqueles municípios que apresentaram baixa disponibilidade de cobertura de saúde da família ou de clínicas ambulatoriais e com baixa infraestrutura urbana eram os mais propensos a apresentarem as maiores taxas da doença na população obstétrica,” reforça o pesquisador.

Mortalidade na população obstétrica

Foram encontradas 15 cidades brasileiras com risco elevado de morte materna por covid-19. Quatro destes municípios estão localizados em Minas Gerais. Os outros pertencem aos estados de São Paulo (3), Goiás (2), Mato Grosso do Sul (1), Amazonas (1), Roraima (1), Pernambuco (1), Bahia (1) e Rio Grande do Sul (1).

“A identificação dessas áreas geográficas poderia ser utilizada para direcionar ações efetivas de testagem de massa, isolamento de casos para mitigar a propagação da doença, bem como a destinação de recursos em saúde necessários para prevenir mortes maternas. Os dados também reforçam que as elas constituem um grupo prioritário para receber vacinas contra covid-19,” afirma.


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Casos e óbitos em Sergipe

Os pesquisadores não identificaram nenhum dos 75 municípios sergipanos com risco elevado de incidência e mortalidade por covid-19 quando comparado ao Brasil. Até setembro deste ano, o estado registrou 161 casos de covid-19 em gestantes e puérperas, sendo 57 em 2020 e 104 em 2021. No período, foram contabilizados 14 óbitos causados pela infecção na população obstétrica.

“Pode ser que se fizermos um estudo mais localizado, apenas com dados Sergipe, consigamos observar quais são os municípios prioritários para essa situação no estado; quais são aqueles que apresentam maiores taxas de incidência e de mortalidade,” pontua o epidemiologista.

Publicação na revista médica

Além de Victor Santana Santos, o artigo publicado na revista científica é assinado por Thayane Santos Siqueira, José Rodrigo Santos Silva, Mariana do Rosário Souza, Débora Cristina Fontes Leite, Thomas Edwards, Paulo Ricardo Saquete Martins Filho e Ricardo Queiroz Gurgel.

The Lancet Regional Health – Americas é uma das revistas do conjunto de periódicos de iniciativa global da The Lancet para defender a qualidade e o acesso aos cuidados de saúde em todas as regiões do mundo.

Josafá Neto

comunica@academico.ufs.br


Atualizado em: Ter, 05 de outubro de 2021, 17:27

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