Seg, 03 de maio de 2021, 06:24

Professor da UFS explica por que tomar 2ª dose da vacina contra covid-19 mesmo fora do prazo
Diego Tanajura reforça importância de completar esquema vacinal para conter epidemia

Josafá Neto e Osmar Rios | Rádio UFS - Aracaju é uma das 115 cidades brasileiras com a aplicação da segunda dose da Coronavac prejudicada por falta de repasses de novas doses. Mais de 11 mil pessoas aguardam a distribuição de novos imunizantes do Instituto Butantan para completar o esquema vacinal na capital sergipana.

A interrupção na aplicação da dose de reforço da vacina contra a covid-19, após atrasos no envio de insumos da China e com a recomendação do Ministério da Saúde de liberar o uso dos imunizantes armazenados para a primeira dose, gerou apreensão quanto à garantia da proteção imunológica diante da perda do prazo do ciclo vacinal.

O professor de Imunologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Diego Moura Tanajura, esclarece as principais dúvidas sobre o assunto. Ele tem experiência no desenvolvimento de pesquisas sobre testes e ensaios pré-clínicos de vacinas no Brasil.

+ Professor da UFS esclarece dúvidas sobre uso de doses de vacinas diferentes contra covid-19


"Esquema vacinal é feito com duas doses do imunizante," reforça o professor Diego Tanajura. Foto: Josafá Neto/Rádio UFS
"Esquema vacinal é feito com duas doses do imunizante," reforça o professor Diego Tanajura. Foto: Josafá Neto/Rádio UFS

Por que se deve tomar a segunda dose da vacina contra covid-19 mesmo fora do prazo? É importante até fazer um alerta para a população que, mesmo passando do prazo dela tomar a segunda dose, independente do motivo, se foi por falta de vacinas, se foi porque a pessoa acabou pegando covid-19 e teve que esperar esse prazo de 28 dias para poder tomar a vacina, ela tem que tomar a segunda dose da vacina e completar o esquema vacinal. As duas vacinas que nós temos disponíveis precisam de duas doses para isso. Então, o esquema vacinal é feito com duas doses do imunizante. Independente do prazo, tem que voltar para tomar a segunda dose.

Há riscos se houver atraso no intervalo de aplicação da dose de reforço da vacina? O "risco" está diretamente ligado ao tempo do atraso. Sabemos, com base em outras vacinas não apenas para a covid-19, que os pequenos atrasos não interferem na eficácia do imunizante, não reduzem a eficácia da vacina. Atrasos de algumas semanas não vão impactar na eficácia. É claro que entendemos que a população está muito aflita com isso, todo mundo quer receber logo o seu imunizante para ficar protegido contra esse vírus. Então, o risco que temos, realmente, é o que? Você atrasando a segunda dose, atrasa também a proteção da pessoa, ela vai demorar mais tempo para ficar protegida contra o vírus. O problema não é a vacina perder a eficácia, mas sim aquela pessoa demorar mais tempo para ficar protegida contra o vírus. Por isso, não podemos relaxar nas medidas de segurança, de cuidado, principalmente neste momento.

Essa situação fez surgir uma dúvida: por que algumas vacinas têm duas doses e outras apenas uma? É o mais comum termos vacinas com mais de uma dose. Se olharmos o panorama das vacinas contra a covid-19 em uso no mundo, apenas duas vacinas são de dose única. Uma é a da Johnson & Johnson. A outra é a da CanSino. Então, a dose de reforço é comum. Se você pegar a carteira de vacinação do seu filho, por exemplo, vai observar que a grande maioria das vacinas precisa de mais de uma dose, porque uma dose só da vacina não é suficiente para induzir uma proteção elevada. Às vezes, também, essa proteção não é de longa duração. Além disso, o que diz se a vacina vai ser de uma dose ou não são os resultados dos estudos e a própria formulação da vacina.

Nesse caso, por que as vacinas têm intervalos diferentes na aplicação das doses? Isso traz implicações quanto ao efeito da vacina? Vamos usar os exemplos das duas vacinas que já estão sendo aplicadas no Brasil: Coronavac e AstraZeneca. Elas possuem intervalos diferentes entre a primeira e a segunda dose, apesar de serem vacinas que protegem contra a mesma doença. O motivo disso é porque elas são vacinas com composições e estratégias diferentes. A Coronavac é feita do vírus inteiro morto. A AstraZeneca é feita de vetor viral. Então, são metodologias distintas. Outro ponto também foram os resultados dos estudos. Foi observado lá no início que no intervalo menor de quatro semanas entre a primeira e a segunda doses, a eficácia da AstraZeneca ficava em torno de 62%, mas quando aumentava esse intervalo para 12 semanas, subia para 82%. Então, você observa que esses intervalos diferentes, realmente, tem implicações na eficácia da vacina.

Quais são os riscos para o controle da epidemia ao não se completar o esquema vacinal? As vacinas protegem não só a pessoa que tomou o imunizante, mas também todas as pessoas ao seu redor. Isso é o que chamamos de imunidade coletiva. Por isso, quando você tem um esquema de imunização incompleto, tem um grande risco, não só individual, como também coletivo, porque essa pessoa não quebra totalmente a cadeia de transmissão do vírus. Outro problema relacionado ao controle da pandemia é a seleção de variantes mais transmissíveis, mais letais. Para entender isso, vamos fazer uma analogia com os antibióticos. Isso porque, quando a pessoa não segue o tratamento da forma correta com o uso de antibióticos, parando na metade do tratamento, acaba selecionando as bactérias mais resistentes. Então, o mesmo pode acontecer com o esquema incompleto da vacina contra a covid-19, selecionando variantes mais letais, mais resistentes do coronavírus.


Atualizado em: Seg, 03 de maio de 2021, 12:42

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